Serendipity

The laws of chance, strange as it seems,
Take us exactly where we most likely need to be
[David Byrne]

quinta-feira, 30 de setembro de 2004

A viagem (2)

Quando deu conta que estava perdida, encostou-se à parede e deixou cair umas lágrimas. Foi abordada por dois transeuntes e violou as instruções expressas de não falar com desconhecidos. Os desconhecidos eram alemães, a língua estrangeira que melhor dominava. Levaram-na a uma esquadra de polícia e, enquanto ajudava italianos a entenderem-se com alemães, disseram-lhe que já estava “achada”.

[Eu tinha muita experiência de estar perdida. Desde que comecei a andar que bastava sair à rua para me perder. Na praia atavam-me ao chapéu-de-sol para evitar que desaparecesse ao mínimo virar de costas. Era banal perder-me em feiras e mercados, e em qualquer outro lado. Quando me apercebia que não tinha ninguém conhecido por perto dirigia-me à primeira pessoa que passasse e informava “perdi-me dos meus pais” (dos meus tios, dos meus avós, etc.), e lá ia pela mão enquanto decorriam os esforços para proporcionar o reencontro. Chegava a ter um certo gosto na aventura quando metia cabine de som e ouvia o meu nome a ecoar pelo recinto. Naquelas horas passadas no banco da esquadra não me ocorreu, pelo menos conscientemente, que a minha irmã pudesse estar a passar um mau bocado.]

Em Florença a minha irmã perdeu-se. Melhor dizendo, os adultos perderam-na. Afligiram-me muito com a sua aflição, não me diziam directamente o que se passava, apenas exibiam as suas caras consternadas. Eu estava preocupadíssima mas não sabia exactamente como o quê. Não podia falar para não quebrar a gravidade do momento com potenciais disparates. Sentaram-me num banco da esquadra durante horas intermináveis (não foram mais do que duas) e, por fim, comunicaram-me: “já a encontraram”. O ar grave mantinha-se e eu demorei algum tempo a perceber que aquilo eram as boas noticias. A emoção maior deu-se quando, em seguida, fomos levados para outra esquadra num carro da polícia com sirene a funcionar e tudo. Durante o tempo em que fiquei sozinha no banco da esquadra lembro-me de ter pensado “estou para ver o que é que a avó vai dizer disto...”.

You’re so vain

Provavelmente pensas que este post é sobre ti.

quarta-feira, 29 de setembro de 2004

Aniversário

Li na Pública que a Mafalda estava quase a fazer anos. Depois esqueci-me, depois lembraram-me.

Costumava jogar um jogo com a minha irmã: uma citava o primeiro balão e a outra tinha de completar o diálogo e descrever o resto da acção. Tínhamos material para as quatro horas que, na altura, demorava a viagem Lisboa-Malaposta ou Malaposta-Lisboa. O Miguelito, por seu lado, não tem irmãos.

Dizem que faz 40 anos. Percebo que não queiram dizer exactamente «a Mafalda faz quarenta anos» mas mesmo assim soa-me muito mal.

O Miguelito sim, fez mesmo 38 anos neste verão. O miúdo não é estúpido.

Por estas bandas a Mafalda está sempre a fazer anos mas nunca cresce.

Trabalhos de casa - Sam

Itália.
Aeróbica.
Laranja.
Gato.
Carro.
What a feeling.
Working Girl.
Mafalda.
Bola de berlim com creme.
CD.
Comics.
Lawyer.
Saia.
Coragem.

Bom é bom

Mas melhor é melhor.

Pedro das Arábias

É o nome do restaurante marroquino onde fui ontem jantar. Eu tinha criado algumas expectativas, não só por gostar muito daquela comida como também pelo facto do sítio ter sido recomendado por uma pessoa minha conhecida ligada ao ramo da restauração. Não gostei nada. O ambiente não era especialmente acolhedor, o serviço foi agradável mas lento. As entradas escaparam apesar do pão ser de pacote mas o couscous foi um verdadeiro flop. Só me soube bem o chá de menta. A comida estava tão desenxabida que já nem se quis correr o risco de provar as sobremesas. Para esquecer.

terça-feira, 28 de setembro de 2004

A viagem

Metemo-nos no carro cheio de bagagem, incluindo no tejadilho, e partimos de Lisboa numa madrugada do início de Agosto. Íamos de férias mas o destino era surpresa para mim (8 anos) e para a minha irmã (11 anos); não sabíamos sequer se era longe. Quando chegámos à ponte perguntei: “ainda falta muito?”. Decidiu-se esclarecer de imediato o destino destas férias especiais: “Vamos até à Grécia!”. Abriu-se o mapa da Europa virado para o banco de trás: “estamos aqui e vamos até aqui. Mas não é tudo de seguida, vamos parando em vários países”.

A viagem durou um mês. Espanha, França, Itália, Jugoslávia, Grécia e voltar. Quatro pessoas e uma tenda grande (um verdadeiro T2).

À enésima vez que perguntei “quantos quilómetros faltam?” seguido de “isso quer dizer quanto tempo?”, ainda não devíamos ter chegado à fronteira, ensinaram-me a fazer contas de cabeça. Se viajarmos fora da auto-estrada vamos, em média, a 60 km/h, e isto quer dizer que o número de quilómetros da distância a percorrer é igual ao número de minutos que vamos demorar; ou seja, se faltarem 90 quilómetros, faltam 90 minutos. Se viajarmos na auto-estrada vamos, em média, a 120 km/h, e isto quer dizer que o número de minutos que vamos demorar corresponde a metade do número de quilómetros da distância a percorrer; ou seja, se faltarem 90 quilómetros, faltam 45 minutos. Fizeram-se uns testes para confirmar que a explicação tinha sido bem percebida e a partir daí só me interessava saber, no início de cada etapa, quantos quilómetros iríamos fazer. Distraía-me imenso com os cálculos. Converter os minutos em horas ainda me dava algum trabalho.

Parêntese

segunda-feira, 27 de setembro de 2004

Walkdog

Primeiro fala-se mais alto, gesticula-se, dão-se pancadinhas no ombro para chamar a atenção. Gradualmente deixa-se de querer falar, já não nos ocorre nada para dizer e também já não ouvimos o que se passa à nossa volta. Nesta fase é como se, por contágio e contra a nossa vontade, nos tivessem sido transmitidos todos os sintomas do isolamento do outro. O que fica para lá das fronteiras do nosso pensamento não nos desperta qualquer tipo de interesse mas, ao mesmo tempo, a nossa cabeça está muito menos interessante. Esforçámo-nos por esvaziá-la de qualquer possível tópico de conversação por sabermos que a comunicação é impossível e depois somos forçados a ficar sozinhos com o vazio. É muito difícil saber ficar sozinho quando se está acompanhado.

A melhor defesa é o ataque

Sinto-me mais segura em arriscar e ser ferida em combate do que ficar quieta, à espera. É que nestas últimas circunstâncias, apesar de estar escondida, quem está com medo que lhe preguem um susto, sou eu. Avançar em direcção à linha inimiga, dá-me pelo menos a possibilidade de não morrer numa emboscada.

Vida de mãe - episódio 6

Hoje de manhã, o meu filho agarrou-se à minha perna e disse: "A mãe vai trabalhar, eu vou para a escola". Calou-se para pensar mais um bocadinho e depois acrescentou: "Eu fico sozinho". Ao ouvir estas últimas palavras, senti um enorme nó na garaganta que consegui disfarçar a custo. "Claro que não ficas sózinho. Vais passar o dia com os teus amigos, fulano, beltrano e cicrano". Ele não insistiu, agarrou nos dois bonecos que escolheu para lhe fazerem companhia no infantário e dirigiu-se para a porta da rua com um ar decidido. Olhei para ele com admiração. O meu piolho é um miúdo valente.

sexta-feira, 24 de setembro de 2004

Sonha que não pagas mais por isso

Pagas, pagas.

Maria Von Trapp

Isto de fazer perguntas sem saber se vamos gostar de ouvir a resposta, às vezes corre mal.

(early) morning rub

Falta-me qualquer coisa.

Ah, é capaz de ser o jornal.

quinta-feira, 23 de setembro de 2004

Memento-it

Não me lembro da cara dele. É sempre a primeira memória a apagar-se; uma coisa aparentemente tão marcante. E suspeito que quanto mais me puder lembrar da cara mais me vou conseguir esquecer do resto. Mas posso estar sugestionada pelo “quem vê caras não vê corações”. Próxima tatuagem: “fotografa-o e esquece de vez”. [agora até tens uma máquina digital do tamanho de um maço de tabaco. Bolas, não me fales em maço de tabaco.]

E più mi vorrai e meno mi vedrai
E meno mi vorrai e più sarò con te
E più mi vorrai e meno mi vedrai
E meno mi vorrai e più sarò con te
E più sarò con te, con te, con te
Lo giuro.
(Tiziano Ferro, «Sere Nere»)

Recados

Já não lêem os emails e há até quem se dê ao luxo de estar sem acesso há mais de imenso tempo. Acham que é só ler isto e pronto. Então cá vai: jantar só na segunda ou na terça (eu preferia na terça), antes disso temos a festinha do Piricus e eu espero que se possa entrar sem convite porque o meu foi para lavar com as calças (sorry). Mas o mais importante, para o jantar, é levar os trabalhos de casa feitos. Estive agora a ver que os trabalhos foram passados em 11 de Maio! Avanço até com uma tentativa de chantagem: sem os trabalhinhos feitos não há novidades pra ninguém.

quarta-feira, 22 de setembro de 2004

Dummy

Metafori

Estava a pensar (...quit while you’re ahead...) em como embirro com algumas metáforas demasiado vistas ou melodramáticas. Se dizem ou escrevem “estou numa rua sem saída” penso mesmo numa rua sem saída, visualizo-a para me abstrair do lugar comum. Numa rua sem saída, não; na minha rua sem saída. Alto... Eu morava numa rua sem saída! Que bela metáfora.

terça-feira, 21 de setembro de 2004

On the edge (2)

Tudo m'irrita, tudo m'enerva. Grrr.

C'est extra

80% da música que ouvia entre os 9 e os 23 anos não foi escolhida por mim, não tinha sido comprada por mim nem para mim. Eram as escolhas e gostos musicais de outra pessoa. Aos 23 comecei a trabalhar e deixei de ter aquelas longas tardes em casa a pôr discos. Gravei umas cassetes para ouvir no carro mas, claro, com as minhas escolhas musicais, coisas do meu tempo. Nada daqueles discos que ouvia em casa só porque estavam ali e porque estava tão habituada a ouvi-los como se tivessem sido comprados por mim ou para mim. Mas não tinham sido.

Entretanto separei-me de todos aqueles discos que não eram meus e há quase quatro anos que os vou comprando, agora sendo (como se fossem) as minhas escolhas e os meus gostos musicais. Mas não é fácil porque eu quero exactamente o mesmo disco, que reconheço pelo grafismo da capa e não pelo nome do álbum. Ora, há por aí muito vinil que ninguém se deu ao trabalho de pôr em cd. Ainda por cima não sei identificá-los pelo nome, embora possa fazer uma descrição detalhada das cores e desenhos da capa. Também já vi darem uma capa diferente ao álbum quando editado em cd. E ainda há um outro problema, que é o dos álbuns (sejam vinil ou cd) que têm capas diferentes consoante o país onde foram editados e/ou capas novas para reedições.

Alguns dos que encontrei: «Flowers» dos Rolling Stones; quase todos os do Cat Stevens (ainda não consegui apanhar o do caixote do lixo e o do chá, mas arranjei um «best of» para ir remediando); «Days of the Future Passed» dos Moody Blues; a «Ópera do Malandro» do Chico Buarque; e o «Tommy» dos Who.

Aqueles que não encontro, como o do Patxi Andión e o do Herbert Pagani, têm sido substituídos por álbuns que contenham o maior número das músicas que os outros tinham. Disso lembro-me: do nome das músicas; sei-as de cor, mesmo quando não percebo nem metade. É o caso do cd que comprei este fim-de-semana. Não era o que eu queria. O que eu queria tinha o cantor em grande plano na capa, com uma camisa vermelha e aquele cabelo branco todo no ar. Então comprei um álbum que tem, pelo menos, cinco das músicas que o outro tinha. E tem esta: «C’est Extra».

(se seguirem este link e clicarem ao lado do nome da música é suposto conseguirem ouvir o primeiro verso, e até vou colar aqui só essa parte da letra)

Un' rob' de cuir comme un fuseau
Qu'aurait du chien sans l'faire exprès
Et dedans comme un matelot
Un' fill' qui tangue un air anglais
C'est extra
Un moody blues qui chant'la nuit
Comme un satin de blanc marié
Et dans le port de cette nuit
Un' fill' qui tangue et vient mouiller.
C'est extra, c'est extra, c'est extra, c'est extra.

On the edge

Conheci um equilibrista muito orgulhoso, corajoso e hábil. Não havia nada que ele não conseguisse fazer em cima da corda. Sempre muito aprumado, entrava em cena com o rufar dos tambores e saía invariavelmente acompanhado pelo barulho das palmas. Passados uns anos, até já fazia o percurso de olhos fechados, de frente para trás e de trás para frente. Ouvi-o atentamente gabar-se dos seus feitos e depois perguntei-lhe porque é a corda estava colocada a meio metro do chão...

segunda-feira, 20 de setembro de 2004

Coisas

Acho que quem reclama por causa de traduções é demasiado sofisticado, a atirar para o picuinhas, tirando quando sou eu. Cheguei à conclusão que acho isto porque: (i) leio muito pouco; (ii) o que leio em português foi, por regra, originalmente escrito em português; e (iii) quando leio livros traduzidos e reclamo da tradução é porque a tradução se assemelha a uma pasta viscosa que escorrega e alastra e se interpõe entre mim e aquilo que o autor pretende dizer-me, de modo que já não se consegue ver mais nada senão aquilo; ou seja, não é um pormenor.

Não é um pormenor, por exemplo, que tenham posto o Calvin a dizer que a sua filosofia de vida é “procurar o número um”, do inglês “look out for number one”. É raro encontrar livros de comics no original (note-se que só me interessa o original se o original for em inglês). De vez em quando apanho uns na Fnac mas parece-me sempre que foi por acaso, que nem era suposto aquele livro estar ali àquela hora em que eu o apanhei. Enfim, comprar na internet, não é? Mas não: do Calvin e do Garfield tenho alguns em inglês mas todos comprados lá fora, como quem diz fui ao estrangeiro, comprei-os numa livraria e trouxe-os; o resto tenho tudo em português, excepto o Mutts com o qual se deram dois acasos e mais uma história de uma encomenda que não era para mim e passou a ser.

O “resto” inclui o Zits, o Fox Trot, a Cathy, o Adam, entre outros. O autor do Adam é o Brian Basset e finalmente estamos a chegar à razão de ser desta lengalenga. O Brian Basset tem agora (desde Maio) uma nova série chamada «Red and Rover». Quando fiz a revista aos comics deste fim-de-semana, lá estava, editado pela Gradiva como é costume. Ora, a revista aos comics consiste em inspeccionar duas ou três tiras ao calhas, de cada nova edição, sem aviso prévio. Só li uma tira, dizia assim o cão: “vi um esquilo e foi superior a mim.”. No quadradinho seguinte pergunta o miúdo: “tu gostas, de esquilos?”

Não encontrei qualquer dado referente à identificação do(a) tradutor(a). Mas não é só por isso que estou impedida de o(a) insultar; a verdade é que a minha afabilidade é superior a mim e eu gosto, de tradutores.

Fica uma tira do Fox Trot para animar.

Vida de mãe - episódio 5

Ontem, fomos a uma festa de aniversário do filho mais novo de uma grande amiga minha. O pirolito demorou um bom bocado de tempo a ambientar-se. Atacou primeiro a comida e só depois investiu nos pequenos convidados. O escorrega foi uma grande atracção mas a melhor animação da tarde foi, sem dúvida, o colchão de balões. Uma ideia muito simples e fantástica. A minha criança passou um bom bocado a saltar, a cair e a rir. Estava tão divertido que, de vez em quando, olhava para mim para ter a certeza que aquela brincadeira não era um disparate. Depois, cantámos os parabéns, tirámos fotografias e, já quase de noite, tivemos de ir embora. Quando cheguei a casa, o meu filho já dormia. Deitei-o. Ele enroscou-se, esticou os braços para agarrar o urso e sorriu: hoje foi um dia muuuuuito bom.

sexta-feira, 17 de setembro de 2004

Am I living in a box?

Passei meia hora numa sala de espera a olhar o aquário mais extraordinário que vi nos últimos tempos. Não era pelo tamanho mas era um aquário grandito. Os corais e a vegetação aquática que eu não conseguiria nomear; os peixes vivaços de vários tamanhos e de todas as cores. Entretanto comecei a ouvir vozes,

[- Nemo's small enough to get inside the filter. Then all he has to do is jam it with a pebble so it stops working. Then the tank will get dirty, and he'll have to put us in plastic bags to clean it. Then we roll out the window, down to the ground, across the street, and into the ocean. It's foolproof.
- It'll never work.
- Fish aren't meant to be in a box, kid. It does things to them.]

e a ver coisas,

e lembrei-me do Sid.

Estrada Mágica

Ir ter com o destino e voltar para casa.

Seamisai (porque hoje é sexta)

Eu sabia que tinha alguma coisa para dizer sobre o “Princípio, meio e fim” e o “Sentimento procura-se”.
Non dire no, che ti conosco e lo so cosa pensi
Non dirmi no.
Os tempos vão,
Foram-se os tempos e agora te calas,
Tu já não falas se falo de amor,
Se tens as malas prontas, não finjas, tudo acabou.
Porquê já não se vê
O teu sorriso ao amanhecer?
Porquê já não sou mais teu bem querer?
Se ami sai quando tutto finisce
Se ami sai come un brivido triste
Come in un film dalle scene già viste
Che se ne va, oh no!
Se o amor acaba a ninguém cabe a culpa,
Se o amor acaba não cabe desculpa
Agora aperte as minhas mãos, sim.
Pra que reste o recordar, sim.
Amanhã.
E non si può
Chiudere gli occhi e far finta di niente
Come fai tu quando resti con me
E non trovi il coraggio di dirmi che cosa c'è.
Sarà dentro di me come una notte d'inverno perché
Sarà da oggi in poi senza di te
Sei que me amavas e agora é tão tarde
Sei que me amavas e agora é saudade
No nosso filme o fim será triste
Não quero ver, oh não!
Sabes que é chegada a hora das dores
Dores de quando se acabam os amores
Agora aperte as minhas mãos, sim.
Pra que reste o recordar, sim.
Amanhã
Não estarás
Mais aqui.
(Laura Pausini e Gilberto Gil, «Seamisai», é mesmo assim tudo pegado. ambos cantam em italiano e em brasileiro. é muito bom. depois hás-de ouvir porque tenho o disco lá em casa)

quinta-feira, 16 de setembro de 2004

Jogar a outra coisa

Primária (3)

Era especialmente competente na música e na natação (esta, segundo me disseram, por uma questão de caixa torácica). Aos 11 anos abandonei as duas especialidades. Estava visto que não contribuiriam para o preenchimento de nenhum dos items da lista de família.

Lapsos geracionais

Verifico que ao escrever isto padeci, por momentos, de long term memory loss. Desde o principio que os descendentes da avó T. começam pelo fim; o que quer dizer que, na verdade, já lá vão mais de três décadas. Dava para explicar as causas para a memória selectiva, mas seria demorado.

quarta-feira, 15 de setembro de 2004

Geração espontânea

[à nossa PR que, num minuto, convidou dezenas de pessoas para a inauguração:]

Admiro as coisas que se geram dentro deste bigo.

[às dezenas de pessoas que compareceram: isto dos croquetes foi só hoje; amanhã não há mais.]

Partilha

I know you see me watching you
and I see you watching me

A sabedoria dos mais velhos

Única reacção não censurada da avó T. à notícia: “começam pelo fim!”. Existe uma lista, nunca expressamente ensinada mas tacitamente imposta, que será qualquer coisa como isto: 1. estudos, 2. carreira profissional, 3. aquisição de casa, 4. casamento, 5. filhos (não ler “cinco filhos”; isso seria claramente demais para um orçamento familiar que se pretende próspero). Há mais de uma década que os seus descendentes (incluindo de primeiro grau) “começam pelo fim” sem que daí advenha qualquer mal. Excepto para a própria que fica cada vez mais isolada com as suas sentenças e vaticínios de desgraça.

A minha lista (é permitido começar por qualquer lado):

15 de Setembro

Aqui vamos nós !

terça-feira, 14 de setembro de 2004

iJÁH!

O pai da Liberdade é socialista. Já o pai da Mafalda tem uma orientação política com a qual me identifico muitas vezes.

Primária (2)

Ao ler, saltava palavras e “lia” outras que não estavam no texto, o que se tornava indisfarçável quando a leitura era feita em voz alta. Os ditados eram uma lástima. A transformação das letras e das palavras em sons, e dos sons em letras e palavras, era um enigma. Escrevia uma palavra com todas as sílabas que a compunham, mas fora de ordem. As palavras pequenas (“que”, “em”, “era”, “como”, etc.) ou não chegavam a sair da cabeça para o papel, ou eram escritas a dobrar. As dificuldades também transpareciam na expressão oral. Usava vocábulos que não existiam mas eram foneticamente semelhantes àqueles que queria usar; trocava o significado de palavras parecidas; comia sílabas de palavras mais longas só dizendo os sons essenciais. A família divertia-se e não posso dizer que isto me preocupasse.

Lia «Os Cinco», «Os Sete», «O Colégio das Quatro Torres» e as outras colecções da Enid Blyton, a Alice Vieira e o mais que a minha irmã fosse recomendando (“a minha irmã sabe...”). Mas gostava muito mais de comics: a «Mafalda» e o resto do Quino, o «Hi and Lois», o «Olho Vermelho», e também de toda a banda desenhada. Neste género, os meus preferidos eram o «Petzi», e os «Estrumpfes» («Patinhas» é que não podia ser porque “põem os miúdos a falar brasileiro”).

[O meu pai coleccionava a revista «Tintin». Eu acabava por ler cada número de uma ponta à outra, mas começava sempre pelas histórias que não eram “em continuação” e que normalmente tinham só uma página, como o «Achille». Depois logo ia ao «Spirou», «Lucky Luke», «Astérix», etc. Gostava mesmo do Fantasio e, mais tarde, do Gaston Lagaffe, que “trabalhava” na redacção do jornal onde o Spirou era jornalista. E o Marsupilami... entusiasmei-me.]

Desenvolvem-se técnicas que conseguem minorar os efeitos nefastos. Lê-se duas ou três vezes um texto para conhecer o sentido real das afirmações. Não é para compreender o conteúdo; é porque, na primeira leitura, saltou-se um “não” ou um “nem” e leu-se o contrário do que foi escrito. Revê-se tudo o que se escreve, também duas ou três vezes, apagando-se as palavras repetidas e acrescentando-se as que se pretendeu escrever mas não estão lá. Ler em voz alta continua a ser problemático. Ironicamente (e obviamente), ganhei um faro apuradíssimo para detectar gralhas e uma exagerada aversão a todo o tipo de erros ou meros lapsos de escrita. Especialmente os meus, aqueles que, mesmo à terceira revisão, escapam.

segunda-feira, 13 de setembro de 2004

Jaws

Hoje tive um pesadelo que me estragou o sono. Estava numa piscina enorme com o meu filho. Era de noite e não havia mais ninguém no recinto. Tinha-se instalado um ambiente frio e inquietante que me fez querer sair rapidamente da água. Ao iniciar o trajecto até às escadas, os meus pés tocaram numa superfície lisa e escorregadia. Olhei para ver o que era e descubro primeiro a cabeça e depois o resto do corpo de um peixe gigante. Um tubarão branco com a boca ligeiramente aberta e os olhos redondos pretos virados para nós. O animal não se mexia. Estava tranquilamente à espera que entrassemos em pânico para nos atacar.

Os efeitos terapêuticos da terapia

Well, do you think many people run around thinking about how happy they feel and how great things are? I mean, maybe they do, but I doubt those people are in therapy.
(Ann, «Sex, Lies and Videotape»)

sexta-feira, 10 de setembro de 2004

Primária

Na 3ª classe a professora chamou-me ao quadro assumindo logo o ar de quem sabe um segredo e vai desvendar um mistério. Disse-me para escrever “faca”. Virada para a superfície negra e enorme, de costas para os outros miúdos todos, de giz na mão com o braço suspenso no ar e o tempo também. Qual - entre o talher e o animal – qual é com “F” e qual é com “V”? Que som faz o “F”? Que som faz o “V”? Rápido. A cabeça encravou e a mão escreveu qualquer coisa. Seguiu-se a exibição de outras «provas» semelhantes. A professora tinha um ar triunfante mas ninguém se ria.

Em Novembro do ano passado, o facto de um psicólogo infantil ter diagnosticado uma particularidade chamada “pensamento visual” a uma criança, foi prontamente desvalorizado: “As tuas professoras da primária também insistiam que eras disléxica e afinal não tinhas problema nenhum”. O inexistente «problema» seria preguiça ou talvez, outro mais temido, burrice.

Tanto mar

quinta-feira, 9 de setembro de 2004

3 da tarde de 9 de Setembro de 1973

Meteste-te num 31 e, diria mesmo, um dia explico isto. Parabéns.

Sentimento procura-se

Um dia acordamos de manhã e não conseguimos encontrar o sentimento. A sensação é momentaneamente desagradável mas acabamos por sossegar o coração: ainda há dias o vimos, o que é vivo sempre aparece. Passam-se semanas, meses, anos. Aos poucos, começa a instalar-se em nós um mal estar que em determinada altura não conseguimos disfarçar mais. Resolvemos então tomar uma atitude e ir procurar o sentimento. Afastamos cortinados, remexemos gavetas, levantamos tapetes, vasculhamos a cave. Nada. O assunto começa a ganhar contornos preocupantes. Decidimos ir perguntar ao outro: "Olha lá, viste o sentimento? Estou farta de procurar mas não o encontro." O outro responde: "Agora que falas nisso, nem sequer te sei dizer quando é que me cruzei com ele pela última vez." Entramos em pânico e tomamos a decisão de arquitectar e pôr em prática um elaborado plano para achar o desaparecido. A partir daqui, das duas uma: ou o encontramos vivo, pregamos-lhe um grande sermão e voltamos com ele para casa desejando que não fuja nunca mais ou...o encontramos morto. Neste caso, só nos restará sepultar dignamente o defunto.

quarta-feira, 8 de setembro de 2004

Bimbos

Gosto do Tiziano (a música dele também não é má) e custa-me que ele se refira a si próprio como un bimbo, ainda que seja uma criança com apenas 24 aninhos (cuchi, cuchi). O Jovanotti começou a gravar aos 19 anos (agora tem 37) e nunca o ouvi tomar-se por bimbo. Não tenho nada contra certo tipo de bimbos, pelo contrário: o Robbie Williams promete continuar a sê-lo daqui a dez anos, quando fizer 40. Já não posso dizer o mesmo de outros bimbos, aqueles que tentam transformar a respectiva mulher na sua segunda mamã. Entre uma coisa e outra, preferia ser tratada como una bimba.

terça-feira, 7 de setembro de 2004

Pobre coitado

Para quem não saiba: o pai da Liberdade é filiado no partido socialista (esta era uma bonita frase em sentido figurado, mas refiro-me ao progenitor da baixinha).

Novidades

A partir de hoje temos comentários. O formato arranjado para o efeito é um bocado antipático: abre-se uma página que pede identificação (parece-me que é só aplicável a comentadores com blogger account), havendo também a opção post anonymously (não acho bem confundir post com comment). Gostava mais que tivéssemos daquelas caixas de comentários pequeninas que se abrem no meio do blog. Além disso, pus o e-mail de forma a que, clicando, se abra logo a caixa para escrever o texto (aquele DISCOVERIES será mudado sob vossa sugestão; não é possível ser-se criativo ao mesmo tempo que se ensaia linguagem html). Também já treinei a introdução de uma coluna de links para aparecer you know when. Tudo isto com a preciosa colaboração de you know who.

Vida de mãe - episódio 4

Mãe, mãe, MÃE! Acordo com o meu filho a chamar por mim. Não pode ser. São 06h30 da manhã. Fui ter com ele. Sua excelência estava sentado à minha espera, acordadíssimo. Quis que me deitásse ao lado dele. O.K. 07h30. Parece ter adormecido. Tento levantar-me da cama sem fazer barulho para ir tomar banho. Mãe? Mãe, eu também quero ir. E foi, claro. Arranjámo-nos, dei-lhe a papa e a seguir fomos os dois passear o cão. 09h00. Já tinha fechado o animal na cozinha. Mãe: quero uma bolacha. Desta vez, resolvi dizer que não. Que não podia ser. Que ele comia a bolacha na escola. Não ficou convencido. Começou a chorar. Entrámos no carro e lá se distraiu com a história do Sol e da Lua. Chegámos. Já lá estavam todos os amigos e até lhe deram a bolacha prometida mas o que ele queria mesmo é que eu não me fosse embora. Primeiro, agarrou-se às minhas pernas, depois exigiu colo. Expliquei-lhe que tinha de ir trabalhar, começou a chorar: hoje, queria ficar comigo. 09h30. Despedi-me carinhosamente mas deixei-o sem mim. 10h00. Bolas. Bolas. Bolas.

segunda-feira, 6 de setembro de 2004

Contra-indicações

A Huma disse-me uma vez: “quem muito pensa não tem filhos; quem tem filhos não pode pensar muito nisso”. É possível adaptar a outros casos: “quem muito pensa não casa; quem casa não pode pensar muito nisso”. Acredito que há questões quanto às quais é contra-indicado pensar demasiado. É saltar com os olhos entreabertos (ou semicerrados), hopping for the best*.
Não creias, Lídia, que nenhum estio
Por nós perdido possa regressar
Oferecendo a flor
Que adiámos colher
Cada dia te é dado uma só vez
E no redondo círculo da noite
Não existe piedade
Para aquele que hesita.
Mais tarde será tarde e já é tarde.
O tempo apaga tudo menos esse
Longo indelével rasto
Que o não-vivido deixa.
Não creias na demora em que te medes.
Jamais se detém Kronos cujo passo
Vai sempre mais à frente
Do que o teu próprio passo.
(Sophia de Mello Breyner, Homenagem a Ricardo Reis)
*expecting the worst não faz o meu género mas há quem diga que é uma boa técnica.

domingo, 5 de setembro de 2004

As Leis da Atracção

Não sei bem, não me lembro, afinal de contas já passaram umas horas. Eram dois advogados, metia um castelo na Irlanda. Mas garanto-vos que tinha um dos melhores argumentos de sempre, daqueles que não se esquecem.

sábado, 4 de setembro de 2004

Um fim-de-semana diferente

Sem filho. Sem sonos e refeições com hora marcada. Sem birras, sem desenhos animados à hora do telejornal, sem disparates. Sem o calor do melhor abraço do mundo.

sexta-feira, 3 de setembro de 2004

Ossétia do Norte

...some children are still being held, as pitched battles continue between troops and hostage-takers...near the scene, news footage showed dead bodies of children on stretchers.
All babies are born saying God's name
Over and over,
All born singing God's name
All babies are flown from the Universe
From there they're lifted by the hands of angels
God gives them the stars to use as ladders
She hears their calls
She is mother and father
All babies are born out of great pain
Over and over,
All born into great pain
All babies are crying
For no-one remembers God's name
(Sinead O'Connor, «All Babies»)
[pois é, esta música fala muito em deus. "When we get to the end of human beings..."]

Efeitos secundários

É verdade que si non uccide fortifica, mas também não é menos certo que quem se fortifica isola-se. Não morre da doença, mas anestesia-se com a cura. Venha o diabo e escolha.
(Ando deliciada com expressões, provérbios e quejandos. E os efeitos secundários desta imagem? Parece que está tudo torto...)

quinta-feira, 2 de setembro de 2004

Coice

Uma mulher comparava o seu actual namorado com o marido que a deixou, dizendo-me: “mais vale burro que me carregue do que cavalo que me escoiceie”. É a postura de carregar ou escoicear que define o animal e não qualquer outro critério. Se me carrega, é necessariamente burro; se me escoiceia, é certamente cavalo. Por outro lado, a expressão resulta de uma racionalização, é uma tentativa de pragmatismo e é também uma manifestação do instinto de sobrevivência. Porque, sejam burros ou cavalos a fazê-lo, ficamos (temporariamente?) fascinados por aqueles que nos escoiceiam.

quarta-feira, 1 de setembro de 2004

Instalação

Never let your conscience be harmful to your health
Let no neurotic impulse turn inward on itself
Just say that you were happy, as happy would allow
And tell yourself that that will have to do for now
Darling it’s a life of surprises
It’s no help growing older or wiser
You don’t have to pretend you’re not crying
When it’s even in the way that you’re walking - baby talking
(Prefab Sprout, «Life of Surprises»)
[You talkin' to me? You talkin' to me? You talkin' to me? Then who the hell else are you talkin' to? You talkin' to me? Well I'm the only one here. Who do you think you're talking to? Oh yeah? Huh? Ok.]

Overdose

Fizeram-me um bolo de chocolate. Não é uma coisa ou a outra, são as duas: amor e chocolate. É o meu - a minha - Karma. (...e aquele número, aquele número no canto superior esquerdo...)

A grande importância dos pequenos hábitos 2

O chá é a bebida que acompanha ou termina quase todas as minhas refeições. O meu favorito é jasmim. Sempre que almoço ou janto fora, faço invariavelmente a mesma pergunta: "Têm chá de jasmim?" Na grande maioria dos casos, a resposta nunca vai ao encontro das minhas expectativas. Só se escapam dos meus comentários maldizentes os restaurantes que à falta do meu sabor preferido lá desencantam o chá verde.